O mês de setembro é um marco histórico para o transporte coletivo da cidade de Santo André. Foi exatamente há 33 anos que o município viu uma mudança significativa no setor. Até então, as empresas operavam cada qual com sua identidade visual e mantinham um “domínio” sobre sua área de atuação, isto é, não permitiam e/ou dificultavam a entrada de uma outra na “sua região” (aspecto que não mudou muito até os dias atuais).
Falar sobre o transporte coletivo é um tema bastante amplo, por isso, será feito um recorte da história, a fim de ilustrar apenas as mudanças que trouxeram, para a cidade, uma nova forma de operação para as empresas. Os fatos explorados a seguir estarão situados a partir dos anos 80.
Nos anos 80, o transporte municipal era operado pelas seguintes empresas: viação Alpina Ltda, viação São Camilo Ltda, viação Campestre Ltda, (assumida pela Humaitá no início desta década), viação Curuçá Ltda, Empresa Auto-Ônibus Circular Humaitá Ltda, viação São José de Transportes Ltda, Expresso Santa Rita Ltda, viação Padroeira do Brasil Ltda, Transportes Coletivo Parque das Nações Ltda, Príncipe de Gales Transportes Coletivos Ltda (assumida pela São Camilo no final da década).
Um dos primeiros momentos importantes do setor foi a determinação de uso do número de linhas (cuja maioria das relacionadas na época persiste até hoje) nos veículos municipais da cidade. Até então, grande parte utilizava somente palavras que representavam origem e destino e algumas davam destaque para um ponto de interesse importante para a população. Nas linhas que ligavam bairros passando pelo centro, um ponto de interesse era – e é, sem dúvida - a estação de trem. Em alguns letreiros da época via-se o destaque para este ponto em alguns veículos como nos ônibus da viação Alpina e da Padroeira para citar duas delas.
Havia uma que não usava nome do bairro. Era a E.A.O.C. Humaitá. Ela usava “CIRCULAR” (onde rodavam os carros mais novos, com letreiro vermelho) para a linha da Vila Suiça e “VALENTIM” (letreiro preto, com os repassados da linha “circular”) para a linha Maracanã.
(DGABC)
A partir do 2º semestre de 1981, tais informações passaram a ser mais sucintas. Tornou-se padrão a informação específica de origem e destino, acompanhada pelo número da linha, colocado (na maioria das empresas) nos dois lados do itinerário.
Se pensar que tais informações estavam sendo usadas nos anos 80 e que o Brasil era um país com um alto índice de pessoas analfabetas, os números passaram a ser mais um mecanismo de identificação, uma forma a mais de “ler” o transporte que atendia a determinada a região. A outra (talvez a forma de identificação mais importante para a época) era a cor. Neste período, cada empresa tinha uma “pintura própria”, isto é, tinham a liberdade de pintar o veículo como quisessem.
Porém, esta foi uma alteração ínfima no meio de um setor que apresentava uma enorme deficiência: algumas empresas operando com uma frota com mais de 10 anos de uso, controle total da operação na mão das empresas, linhas que não atendiam às necessidades da população, longos intervalos entre os veículos, redução de frota pela insegurança dos níveis econômicos e das políticas aplicadas no país, com a impossibilidade de controlar a economia sujeita a sucessivos planos e o aumento assustador da inflação que passava de 200%, tudo isto contribuía e muito para a deteriorização do serviço.
É em meio a esta instabilidade política que surge a AUTC (Associação dos Usuários de Transporte Coletivo de Santo André). Sua atuação na região foi bastante significativa, pois organizava a luta pela melhoria dos transportes, interferindo nas instâncias do poder público. Eleito como prefeito em 1989, Celso Daniel era um dos membros atuantes desta associação.
E foi na 1ª gestão dele, a partir de estudos realizados sobre o transporte, estruturado na experiência da AUTC, com base nos elementos apresentados e sistematizados num documento intitulado Plataforma dos Usuários para os Transporte Coletivo de Santo André que foram fundadas, primeiramente, uma Secretaria de Transportes (10 de maio de 1989) a quem competia controlar a frota municipal, executar obras de manutenção nas vias públicas e sinalizar o sistema viário, além do planejamento, controle e fiscalização dos transportes públicos e em 18 de julho do mesmo ano, a EPT (Empresa Pública de Transportes), com personalidade jurídica de direito privado, patrimônio próprio e autonomia administrativa e financeira, cujo objetivo era desenvolver as atividades do transporte coletivo por meios próprios ou de terceiros, planejar e executar operações de transporte de passageiros, explorar o sistema de tarifas, incluídos passes subsidiados e comuns. (Fonte: Linhas e trajetos. PMSA, SSM, EPT – 2ª edição, 2001)
Vários foram os conflitos desenvolvidos desde a proposta até o início da implantação da empresa. Embora o poder público tivesse disposto a rever alguns pontos do contrato das empresas, eles não estavam dispostos a flexibilizar pontos essenciais da proposta: receita pública e controle público do serviço. Somente após a intervenção em uma das empresas mais importantes do sistema de Santo André (Alpina), em fevereiro de 1990, é que se encontrou um ponto de equilíbrio nas relações entre os empresários e o poder público.
(O papel no para-brisa identificava o processo de intervenção da empresa)
Após a intervenção, ainda no final do mesmo mês, a EPT comprou as 35 primeiras unidades de frota nova (Monobloco O-371), embora não tivesse sido construída a garagem da empresa. Foi por este motivo que a administração municipal (para garantir a possibilidade de operação) acabou por declarar de utilidade pública para fins de desapropriação, o imóvel, os bens, equipamentos, as linhas e a frota da viação Alpina. Tudo isso foi assumido pela EPT.
E foi em maio, após um acordo com o proprietário da empresa, que a EPT iniciou sua operação na cidade de forma gradativa. Respectivamente, a inauguração das linhas ocorreu da seguinte maneira: dia 02 de maio, foi a Jd. Las Vegas/Pq Capuava, operada com 8 veículos; dia 09, foi a vez da Centreville/Parque das Nações e finalmente, dia 28 de maio, a linha Jd. Santo André /Estação Utinga. Em junho, já rodavam 20 veículos em linhas diametrais que ligavam entre os dois subdistritos (lados oeste e leste), possibilitando economia de passagens e tempo para os usuários. (fonte DGABC, maio de 1990).
Mas, as mudanças visivelmente significativas ainda estariam por vir. Uma delas foi a descaracterização de pinturas próprias/particulares produzidas dentro das dependências de suas garagens, além da perda da autonomia da criação. No novo sistema, chamado de “municipalizado”, todas as empresas teriam de usar o mesmo layout. O exemplo da nova forma de identidade visual estava divulgado em outdoors espalhados por pontos estratégicos da cidade. Começava ali, a padronização de pintura no transporte andreense. Esta primeira padronização seria parcial (mesmo layout com variações de cores que seriam vermelho, verde claro, verde escuro, laranja e azul escuro). A pintura nova ostentaria a sigla ST na lateral que representava Secretaria dos Transportes.
Além disso, um novo critério de prefixação começou a ser utilizado: antes as empresas usavam os mesmos prefixos em seus veículos, por exemplo, tinha o ônibus com número 50 na viação Alpina, na Humaitá e na São José. No novo sistema, não se viam mais números repetidos na cidade. As empresas passaram a enumerar seus veículos a partir de blocos (de 2 a 99, de 100 a 199, de 300 a 399 de 400 a 499 e assim sucessivamente, embora algumas englobassem dois lotes).
Vejamos, na prática, como ficaram as empresas a partir da utilização do novo layout de pintura.
Viação Curuçá manteve sua cor tradicional (o verde claro), sua forma de prefixação (sempre números ímpares, mas nesta nova etapa, com “zero” antes do número) e para diferenciar de outra empresa com a mesa cor, depois de um tempo, ganhou a saia (cor colocada abaixo do friso)
Transporte Coletivo Parque das Nações Ltda perdeu completamente sua identidade visual. Na reestruturação ganhou a cor verde clara. Manteve sua forma de prefixação (sempre número pares).
A Viação Padroeira do Brasil Ltda também perdeu totalmente sua caracterização particular. No novo sistema, começou a ostentar a cor laranja (sem saia), seu prefixo de identificação passou a ser na centena 200 e apenas com números pares.
Viação São Camilo Ltda manteve sua cor municipal. Para diferenciar da Padroeira, ganhou saia. Sua prefixação estava relacionada à centena 300. Manteve também a característica de prefixos pares.
Viação Alpina foi substituída pela EPT (Empresa Pública de Transportes) que assumiu a frota, a garagem, os itinerários da Alpina. Os carros que eram da Alpina, tiveram os prefixos alterados para a centena 400, ou seja, este 421 da EPT, era o antigo 121 da Alpina. Perceba pela identificação do prefixo original do lado direito do itinerário. A EPT utilizou prefixos com a centena 400 e 500.
Viação São José de Transportes Ltda manteve uma de suas cores padrão – o azul marinho. Sua ordem de prefixação ostentava as centenas 600 e 700, com números pares.
E.A.O Circular Humaitá Ltda manteve o seu tradicional verde escuro (com saia) e passou a ser prefixada com as centenas 800 e 900 (no início da padronização pares e depois de um tempo começou a ostentar prefixos ímpares também).
Como se pode notar, todos os ônibus da 2ª foto de cada empresa têm o mesmo layout de pintura com ou sem saia, que as centenas não se repetem e todas têm um adesivo no alto do para-brisa com a letra e o número da linha na cor da empresa.
O novo visual estava montado, mas o passo mais importante do sistema era a reorganização das linhas dos ônibus feitas a partir da criação de novas e da expansão ou da extinção de algumas das já existentes. Percebe-se nas fotos acima que a característica das linhas passou a ser com um código alfa-numérico, ou seja, além do número da linha, foi agregada uma letra (código de trajeto) que caracterizaria o tipo de serviço prestado pela empresa. As letras eram: I, B, T, S e U. Mas... o que significavam estas letras e qual a finalidade delas junto aos números?
Estas letras foram colocadas na frente da maioria dos números das linhas que já eram usados desde 1981. Vale salientar que os números utilizados a partir do ano em questão, estavam acima de 10, isto é, a primeira linha era a 11 (lado oeste) e 12 (lado leste). Não se tem, até o momento, nenhum registro do motivo desta conduta e nem por que o 1º subdistrito ostentava somente números ímpares e o 2º, somente números pares. O quadro abaixo esclarece a composição letra+número e o serviço que eles representavam.
Ligação de um bairro a um terminal do centro (letra T + o número da linha – exemplos T15, T27); |
Ligação de um bairro a outro bairro passando pelo centro (letra B + o número da linha, exemplos B11, B63); |
Ligação 2º subdistrito com a estação Saladino (letra S + o número da linha, exemplos S36, S48); |
Ligação entre os dois subdistritos passando por terminais centrais (letra I + o número da linha – exemplos, I04, I05); |
Ligação 2º subdistrito com o terminal de Utinga (letra U + número da linha – exemplos U22, U26). |
Com a nova configuração de linhas, na ocasião, as empresas ficaram distribuídas com os seguintes códigos de trajetos e atendimentos:
EMPRESAS |
CÓGIDOS |
LINHAS |
Curuçá |
I e T |
I01, T12, T14, T16 |
Parque das Nações |
S e T |
S48, T56 |
Padroeira |
I e B |
I06, B47, B51 |
São Camilo |
B e S |
B13, B19, S36, S38 |
EPT |
B, I, T, *C |
I02, I03, I04, I05, I07, B11, B63, T15, T17, C10 |
São José |
Somente T |
T35, T37, T39, T41, T43, T45 |
Humaitá |
B, U, T |
B21, B65, T23, T24, T25, T27, T29, U22, U26 |
Embora parte destes itinerários tenham sido modificados e ampliados atualmente, segue abaixo a descrição de origem e destino de cada uma delas no início da implantação do novo sistema:
Letra B – indicam ligação entre bairros passando pelo centro.
B11 – Bairro Paraíso – Vila Guiomar
B13 – Jd. Sta. Cristina via Vila Junqueira/Vila Alice
B19 – Vila Junqueira/Bairro Campestre
B21 – Cidade São Jorge – Bairro Campestre
B47 – Terminal Vila Luzita via Vila Suíça/Vila Palmares via Prestes Maia
B51 – Jardim Oriental – Jardim Bom Pastor
B63 – Jd. Estela via Hosp. Brasil/ Vila Palmares via Catequese
B65 – Bairro Casa Branca – Vila Sta. Maria
(algumas ampliações extinguiram as antigas linhas 53, 57)
Letra C – Era Circular-Central. Única linha constituída por esta letra. Ela era operada por 5 veículos da EPT. Foi criada bem depois das demais com um atendimento em pontos importantes da cidade: Paço Municipal, Faisa, Hospital da Beneficência Portuguesa, Mappin, Hospital Brasil e depois retornava à estação pela Siqueira Campos e Queirós dos Santos. A novidade dela era que representava a 1ª experiência de integração tarifária da cidade, atendendo aos usuários que vinham do 2º subdistrito e se dirigiam à área central. Quem descesse no terminal, embarcava pela porta da frente, sem pagar uma nova passagem. Na volta, quem tomasse o ônibus ao longo do percurso, recebia do cobrador um passe-integração válido apenas nas linhas integradas.
C10 – Circular-Centro via Terminais
(fonte DGABC)
Letra “I” – Indica ligação entre subdistritos 1 e 2 (lado leste e oeste). Estas linhas foram criadas para melhorar a conexão entre os lados do município. Sua criação extinguiu algumas que faziam parte de seu trajeto. As linhas com código “I” são todas abaixo da dezena 10:
I01 - Parque Erasmo Assunção – Fundação Sto. André
I02 – Centreville – Jardim Ana Maria
I03 – Jd. Bom Pastor – Parque Capuava
I04 – Jd. Las Vegas via V. Linda – Parque Capuava
I05 – Jd. Sto. André até V. Rica – Estação Utinga
I06 – Jardim Bom Pastor – Estação Utinga
(extinguiu as antigas linhas 14, 44, 46, 54, 62 e 67. Posteriormente foram criadas as linhas I07 e I08, dentro do processo de adequação em substituição linhas 44 e 54, visto que as outras 4 já estavam contempladas pela I02, I04 e I06).
Letra “T” – indica ligação entre um bairro e um terminal central. As linhas com código “T” são:
T12 – Jardim Alzira Franco – Estação Sto. André
T15 – Jd. do Estádio – Estação Sto. André
T16 – Parque J. Ramalho – Estação Sto. André
T17 – Jardim Alvorada – Estação Sto. André
T23 – Cidade são Jorge – Estação Sto. André
T24 – Estação Utinga – Estação Sto André
T25 – Vila Suíça via Guaianazes – Estação Sto. André
T27 – Condomínio Maracanã – Estação Sto. André
T29 – Vila Suíça via Queirós Filho – Estação Sto. André
T35 – Represa – Estação Sto. André
T36 – Pq. Novo Oratório via Indonésia – Estação Sto. André **
T37 – Represa via Casa Branca – Estação Sto. André
T39 – Clube de Campo – Estação Sto. André
T41 – Vila João Ramalho via v. Junqueira – Estação Sto. André
T43 – Jardim Irene – Estação Sto. André
T45 – Vila Suíça via Cisplatina – Estação Sto. André
T56 – Jardim Utinga – Estação Sto. André
**(a linha T36, foi modificada para S36 (Est. Pref. Saladino/P.N. Oratório) ainda no processo de adaptação). Extinguiu a antiga linha 34.
Letra “S” – inicialmente indica ligação entre bairros do lado leste e a Estação Prefeito Saladino.
S38 – Parque Capuava via av. dos Estados – Estação Prefeito Saladino
S48 – Pque. Capuava via Estação Prefeito Saladino – Estação Sto. André
Letra”U” – indica ligação entre um bairro do lado leste e a Estação de Utinga. São apenas duas:
U22 – Estação Utinga via V.Lucinda – Parque Capuava
U26 – Estação Utinga via Tintas Coral – Parque Capuava
Todas as alterações foram publicadas num jornal orientador, distribuídos gratuitamente à população para que se conscientizassem das alterações. Como foi dito acima, linhas foram criadas, algumas ampliadas e outras extintas. No jornal, vinha a linha habitual (exemplo linha 13) com seu trajeto especificado - ruas por onde operava - e a modificação pela qual passou, também indicando o novo trajeto operacional com seu número e código de letra (por exemplo: antes – VILA JUNQUEIRA ATÉ ESTAÇÃO STO. ANDRÉ e com a modificação, JD.STA.CRISTINA VIA V. JUNQUEIRA ATÉ VILA ALICE, atualmente JD. ACLIMAÇÃO ATÉ VILA ALICE – B13).
Importante destacar que durante a implantação (setembro-outubro), equipes de estudos estavam atentas e iam fazendo adequações, modificações a partir da identificação de falhas e/ou de pedidos e abaixo-assinados de usuários, solicitando algumas vezes que determinadas linhas voltassem a passar em pontos habituais como antes (antes JD.CRISTIANA ATÉ VILA GUIOMAR, depois T11 PARAÍSO ATÉ ESTAÇÃO SANTO ANRÉ e ainda na semana de adaptação por deficiência de atendimento descoberto na semana e até os dias atuais, B11 PARAÍSO ATÉ VILA GUIOMAR). (fonte: DGABC)
No novo sistema operacional, foi criado também o serviço noturno, ou seja, foram fixadas linhas que operavam ininterruptamente, isto é, continuavam em funcionamento após o encerramento regular, circulando durante a madrugada, de hora em hora. Era o serviço “negreiro”. As linhas deste horário eram as seguintes; I02, I04, I06, T15, T29, T35.
Todo este novo processo de reestruturação do transporte da cidade foi iniciado justamente no dia 22 de setembro de 1990. A partir do ano de 1997, iniciou-se uma nova fase do transporte coletivo na cidade chamado de “Onda Azul”. Novas mudanças aconteceram neste novo processo como a privatização da EPT (que passou a ser simplesmente gestora do sistema), a criação da Nova Santo André, a utilização de prefixos com milhar e a padronização total de pintura (ônibus totalmente azul com identidade de empresas e números brancos e o nome EPT em destaque no centro da carroceria, em vermelho). Embora boa parte do que foi pensado e executado no início dos anos 90 já tenha sido descaracterizado nas últimas décadas, a maioria do projeto original, no tangente às linhas, ainda é mantido até hoje.